Garantia contratual
Em que momento deve ser exigida?
01 de fevereiro de 2018
 
*Por Priscila Silva


Como se sabe, o objetivo de toda e qualquer contratação pública é o perfeito atendimento da necessidade administrativa. Nessa linha, a fim de resguardar a Administração de eventuais prejuízos que possam ser ocasionados pelo particular por ocasião da má execução do contrato, a Lei nº 8.666/93 muniu os agentes públicos com uma importante ferramenta: trata-se da garantia contratual. 

Consoante preconiza o art. 56 da Lei nº 8.666/93, a Administração pode, consideradas as peculiaridades do objeto pretendido, exigir do futuro contratado a prestação de garantia. Veja-se: "Art. 56 - A critério da autoridade competente, em cada caso, e desde que prevista no instrumento convocatório, poderá ser exigida prestação de garantia nas contratações de obras, serviços e compras". 

Vale ressaltar que a garantia pode ser exigida tão somente do vencedor do certame, haja vista que sua finalidade precípua, repisa-se, remonta à necessidade de a Administração assegurar-se da perfeita execução contratual ou, na sua impossibilidade, do ressarcimento pelos prejuízos eventualmente suportados. Nesse sentido, Joel de Menezes NIEBUHR preconiza que: “esta é a garantia típica do contrato, prestada pelo vencedor da licitação na ocasião da assinatura, com o intuito de precaver a Administração em relação a prejuízos ou danos causados por ele durante a execução da avença”.[1] 

Ainda, quando da aplicação de multa ao particular por inexecução contratual, a garantia revela-se como fundamental para conferir efetividade à sanção aplicada, uma vez que a garantia será utilizada para o seu pagamento no exato montante devido, sendo devolvida ao particular acaso reste quantia a ser restituída ou, ainda, nos casos de insuficiência do valor da garantia, deverá a Administração executar o restante do valor, administrativa ou judicialmente.  Nessa esteira, vejam-se os dispositivos da Lei nº 8.666/93 que tratam da matéria: 
 













 
 

Todavia, no dia a dia da Administração, uma dúvida importante se apresenta: qual é o momento adequado para a exigência da garantia contratual? 

De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Contas da União, conforme se observa dos julgados abaixo colacionados, o momento adequado para a exigência da garantia é em momento anterior à execução contratual:  
 
 













 
 
 



















































Nessa mesma linha, Gabriela Verona PÉRCIO assevera que: "A prestação da garantia deve ser prévia ao início da execução. A rigor, deve ser exigida como condição para a celebração do ajuste, concomitantemente aos trâmites para sua celebração"[5]. A autora adverte, ainda, que o "não recolhimento da garantia deve acarretar consequências ao particular, proporcionais à gravidade da conduta, previstas no ato convocatório ou no contrato. É possível cogitar desde a não celebração do contrato à aplicação de multas e demais sanções, em casos de comprovada má-fé"[6]. 

Considerando-se, pois, a finalidade precípua da garantia contratual, qual seja, resguardar a Administração de eventuais prejuízos decorrentes da inadequada execução contratual, revela-se fundamental que a Administração solicite a prestação da garantia contratual em momento anterior à assinatura do contrato, nos termos dos ensinamentos de PÉRCIO, revelando-se inadequada a sua exigência em momento posterior.  



[1] NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitação Pública e Contrato Administrativo. 4. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2015. p. 817.
[2]  TCU. Acórdão nº 2.292/2010. Órgão Julgador: Plenário. Relator: Ministro José Jorge. Data da sessão: 08/09/2010.
[3] TCU. Acórdão nº 1.679/2008. Órgão Julgador: Plenário. Relator: Ministro Ubiratan Aguiar. Data da sessão: 13/08/2008.
[4]  TCU. Acórdão nº 401/2008. Órgão Julgador: Plenário. Relator: Ministro Guilherme Palmeira. Data da sessão: 12/03/2008.
[5] PÉRCIO, Gabriela Verona. Contratos Administrativos. Manual para Gestores e Fiscais. Curitiba: Juruá, 2015. p. 90.
[6] Id.
  
Art. 86 - O atraso injustificado na execução do contrato sujeitará o contratado à multa de mora, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato. 
§1º A multa a que alude este artigo não impede que a Administração rescinda unilateralmente o contrato e aplique as outras sanções previstas nesta Lei. 
§2º A multa, aplicada após regular processo administrativo, será descontada da garantia do respectivo contratado. 
§3º Se a multa for de valor superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, a qual será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela Administração ou ainda, quando for o caso, cobrada judicialmente. 
Art. 87 - Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a 
prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções: 
(...) 
II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato; 
(...) 
§1º Se a multa aplicada for superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, que será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela Administração ou cobrada judicialmente.  


Relatório 
(...) 
A Lei n.º 8.666/93 não prevê, expressa e textualmente, que a prestação da garantia é condição indispensável para a assinatura do contrato. Diante deste silêncio legal, poder-se-ia cogitar a viabilidade de primeiro assinar o contrato para somente depois o contratado apresentar a garantia contratual. Porém, não parece que isso conduza a melhor opção. 
Esse entendimento contraria a própria finalidade da garantia contratual, pois permite a assunção da obrigação sem a certeza da garantia. O TCU adotou o mesmo raciocínio ao determinar à unidade jurisdicionada que exija a comprovação da prestação da garantia contratual antes da celebração do respectivo termo, em cumprimento ao art. 56 da Lei n.º 8.666/93 (Acórdão n.º 401/2008 - Plenário) . Dessa maneira, em vista da finalidade da garantia contratual, o momento adequado para a Administração contratante exigir sua a prestação pelo futuro contratado é anterior à assinatura do instrumento de contrato. 
A cláusula contratual (Contrato n.º 012 09 0018-00) e editalícia (subitem 10.1 do Edital n.º 083/2008) relativa ao recolhimento da garantia de execução em data posterior à assinatura do contrato com a empresa vencedora do objeto do Edital n.º 083/2008, cujo objeto é o fornecimento, montagem e testes dos materiais equipamentos do sistema de irrigação parcelar para uma área de 1.708 ha, está em desacordo com a Jurisprudência assente no Tribunal de Contas da União (Subitem 9.4.3 do Acórdão n.º 401/2008 - Plenário e subitem 8.2, 'e', da Decisão n.º 518/2000 - Plenário) , ambos relativos à exigência da comprovação do recolhimento da garantia contratual antes da assinatura do contrato, uma vez que tal garantia tem como pressuposto a verificação da capacidade econômica da contratada em executar o serviço, devendo o adimplemento da garantia ser condição para a assinatura do contrato. Uma vez assinado o contrato, não faz sentido efetuar tal exigência, pois pode ocorrer exatamente o que ocorreu 'in casu', vez que passados os 5 dias úteis após a assinatura do contrato, prazo este em que a contratada deveria efetuar o recolhimento de 5% do valor do contrato, mas não o fez, sob a alegação da necessidade de se suspender o contrato por 90 dias, vez que a empresa contratada estaria impedida de iniciar a execução do contrato devido 'a providências necessárias à readequação da configuração perimetral'. 
Acórdão: 
(...) 
9.3. determinar à Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba - Codevasf que, nas futuras licitações e contratos: 
9.3.1. caso previsto no instrumento convocatório, observe rigorosamente o art. 56 da Lei n.º 8.666/93, exigindo, por ocasião da formalização dos próximos contratos firmados, a comprovação da prestação da garantia no momento da celebração do respectivo termo contratual, em obediência ao entendimento jurisprudencial desta Corte de Contas (Subitem 9.4.3 do Acórdão n.º 401/2008 - Plenário e subitem 8.2, "e", da Decisão n.º 518/2000 - Plenário)[2] (sem grifos no original). 
 
9.3.3. atente à exigência de prestação da garantia adicional, nos casos cabíveis, realizando-a de maneira prévia à assinatura dos termos contratuais, como está fixado no § 2º do artigo 48 da Lei nº 8.666/93;[3] 
 
Relatório  
(...) 
5.2.2 Item de audiência - Falta de exigência da garantia prevista na Clausula Décima, § 16, do Contrato nº 17/2001 - UNIFAP, firmado com a empresa [...]. 
5.2.2.1 Manifestação do Responsável - A garantia que a empresa se comprometeu a apresentar e não o fez não causou prejuízo ao Erário, uma vez que os pagamentos efetuados à empresa foram de valor menor que os serviços realmente realizados. Na cláusula segunda do termo de rescisão amigável do contrato com a empresa [...]. ficou estabelecido que a mesma declinou de receber o valor de R$ 64.091,81 justamente por não ter cumprido a garantia contratual (f. 140 e 155, vp) . 
5.2.2.2 Análise - O contrato com a empresa [...] foi celebrado em 04/06/2001, pelo valor de R$ 666.688,13. De acordo com a cláusula quinta, parágrafo 16, do mencionado termo, a empresa deveria ter apresentado uma garantia no percentual de 5% do valor pactuado, resultando em um valor de R$ 33.334,40. A comprovação da prestação da garantia antecede a celebração do contato, conforme se depreende do art. 56 da Lei de Licitações. Nesse aspecto, a cláusula décima segunda do citado termo informava que a empresa apresentou a garantia exigida (f. 164/169, Anexo 1) . Assim, como em sua justificativa o Reitor afirmou que a empresa não cumpriu a garantia, isso significa que o termo de contrato continha uma informação inverídica. O termo rescisório, todavia, informa que a empresa declinou do direito de receber o valor de R$ 64.091,81, por não ter cumprido a garantia contratual, segundo o Reitor, não havendo prejuízo ao Erário. No entanto, é preciso estabelecer uma ressalva: se não houvesse valores a receber ou se a empresa não tivesse declinado do seu direito de receber o valor devido, o Erário incorreria em um prejuízo ou, no mínimo, haveria uma pendência judicial que levaria tempo para ser solucionada, também impondo prejuízo ao Erário. Dessa forma, a atitude da Universidade em não exigir a prestação da garantia contratual impôs um risco desnecessário ao Erário. 
5.2.2.3 Proposta de Encaminhamento - Seja rejeitada a justificativa do Reitor. Deixa-se de propor a aplicação de sanção, uma vez que a ocorrência não resultou em dano injustificado ao Erário. Deve-se, ainda, determinar à Universidade que, em futuras contratações, exija a comprovação da prestação da garantia contratual antes da celebração do termo, em cumprimento ao art. 56 da Lei de Licitações
Acórdão: 
9.1. conhecer da presente Representação [...], para, no mérito, considerá-la procedente; 
[...] 
9.4. determinar à Unifap que: 
[...] 
9.4.3. exija a comprovação da prestação da garantia contratual antes da celebração do respectivo termo, em cumprimento ao art. 56 da Lei nº 8.666/1993[4] (sem grifos no original). 
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